Por milhares de anos, homens e mulheres marcaram seus corpos com tatuagens. Esses desenhos permanentes – simples ou elaborados, mas sempre pessoais – serviram como amuletos, símbolos de status, declarações de amor, sinais de crenças religiosas, adornos e até mesmo como sinais para marcar criminosos ou prisioneiros, como os números que marcavam os braços dos internos do campo de concentração de Auschwitz durante o nazismo.
CONTEÚDO
- O que é tatuagem? Qual a origem dessa palavra?
- Que povos usaram tatuagem?
- Quais são as evidências do uso de tatuagens?
- Como os antigos faziam tatuagens?
- Qual a prova mais antiga do uso de tatuagens?
- As tatuagens terapêuticas de Ötzi, o Homem de Gelo
- As tatuagens da Dama do Gelo, de Altai
O que é tatuagem? Qual a origem dessa palavra?
A tatuagem é uma marca permanente feita na pele humana pela aplicação de pigmentos, tinta ou matéria corante por meio de agulhas ou pontas afiadas.
Por ser permanente, a tatuagem é uma forma de modificação corporal feita na camada da derme da pele.
A palavra é de origem polinésia e chegou ao Ocidente no século XVIII levada pela expedição britânica de James Cook. Ao passar pelo Taiti e Samoa, em 1769, Cook ficou impressionado com os corpos tatuados dos nativos que chamavam essa prática de “tatatau” ou “tatau”, que significa bater ou golpear, originando o termo tattoo, em inglês.
Que povos usaram tatuagem?
Foram encontradas tatuagens entre os antigos egípcios, núbios, gregos, líbios, citas e os pictos (grupo celta da antiga Escócia que os romanos chamavam de “povo pintado”). Soldados romanos se tatuavam com folhas de hera. Com o cristianismo, as tatuagens foram consideradas uma ofensa a Deus pois defiguravam o que foi feito à imagem de Deus.
Várias culturas em toda a África faziam tatuagens, incluindo os belos pontos nos rostos de mulheres berberes na Argélia, as elaboradas tatuagens faciais de homens Wodabe no Níger, e as marcas feitas pelos Iorubás, Fulani e Huaçá da Nigéria. Os coptas cristãos do Egito tatuavam pequenas cruzes na parte interior de seus antebraços.
Na Ásia, evidências de tatuagem foram encontradas entre algumas múmias encontradas no deserto de Taklamakan, na China, datadas de 1200 a.C. A tatuagem também era praticada entre o povo Ainu do Japão.
Na América, as tatuagens foram comuns entre muitos povos pré-colombianos do Chile e do Peru como os nazcas, os mochicas e os chinchorros, povos anteriores aos incas. Corpos mumificados de seis mulheres inuítes da Groelândia, de 1475 d.C., tinham tatuagens faciais.
Muitos grupos indígenas brasileiros usavam e continuam a usar tatuagens como os Matis, Matses, Karajá, Ikpeng e Kayabi que viviam na Amzônia. Também os Apiakás usavam tatuagens, especialmente no rosto, como mostram os desenhos da Hercules Florence de 1820.
Quais são as evidências de uso de tatuagens?
A maior prova de uso de tatuagem é encontrá-la na pele humana preservada. É uma prova arqueológica direta, assim como ferramentas usadas para fazer tatuagem.
Na ausência de provas diretas, pode-se encontrar evidências de uso de tatuagens na arte (pintura e escultura). Os murais da tumba da Senhora de Cao, a múmia mochica encontrada no Peru, trazem as mesmas figuras que foram tatuadas na pele daquela mulher.
Também em textos escritos como poemas, relatos e lendas podem fazer referência a tatuagens, assim como apelidos dados a um povo como fizeram os romanos que chamaram os pictos da Escócia de “povo pintado”.
Como os antigos faziam tatuagens?
Para marcar e ferir a pele, usavam-se ferramentas de osso ou de pedra (obsidiana) afiada. Os indígenas da Amazônia faziam tatuagens com as presas do pirandira ou peixe-cachorro, e também espinhos da palmeira de tucum. Os antigos egípcios usavam ferramentas de metal.
Depois de ferida a pele, esfregava-se fuligem (carvão) para destacar o desenho. Os tatuadores egípcios usavam pigmentos preto, azul ou verde, com pouca variação. Essas cores simbolizam a vida, o nascimento e a fertilidade. Os tatuadores eram provavelmente mulheres mais velhas com experiência em entender os símbolos e o significado das cores.
Em Abidos e na cidade de Gurob, no Egito, foram encontrados, ferramentas de tatuagem datadas de c. 3000 a.C. e c. 1450 a.C., respectivamente. O conjunto de Abidos era formado por pequenas pontas de metal afiadas com cabo de madeira, enquanto o de Gurob eram de bronze.
No Egito Antigo, a tatuagem era uma prática mais comum entre as mulheres, e de diferentes níveis sociais. Os egiptólogos encontraram muito mais múmias femininas tatuadas do que masculinas. Acredita-se que as tatuagens eram usadas como amuleto para proteger as mulheres durante a gravidez e o parto.
Qual é a prova mais antiga de uso de tatuagem?
Primeiro é preciso identificar a idade do corpo tatuado. Para isso, os arqueólogos usam datação por radiocarbono. Esta técnica mede a quantidade de carbono-14 em um organismo morto, compara com os níveis de carbono-14 na atmosfera hoje e fornece uma estimativa de quando o organismo morreu.
Por muito tempo, as tatuagens encontradas em Ötzi, o Homem do Gelo (falaremos dele a seguir) foram consideradas as mais antigas. Porém, elas perderam esse posto em 2018 quando pesquisadores do Museu Britânico examinaram com mais atenção as múmias Gebelein, um corpo masculino e outro feminino naturalmente mumificados, descobertos no Egito.
A luz infravermelha revelou sinais de tatuagem nos dois corpos. A múmia masculina tinha um desenho em seu bíceps: dois animais com chifres ligeiramente sobrepostos identificados como um touro e uma ovelha. A múmia feminina trazia quatro pequenos motivos em forma de “S” sobre seu ombro direito.
As múmias Gebelein, datadas entre 3351 e 3017 a.C., período pré-dinástico do Egito, são, portanto, as mais antigas tatuagens conhecidas.
As tatuagens terapêuticas de Ötzi, o Homem de Gelo
Ötzi, nome dado à múmia masculina preservada no gelo dos Alpes, tem sido intensamente pesquisada desde a sua descoberta em 1991 na fronteira entre a Itália e a Áustria. Ötzi era um caçador da Idade do Cobre que morreu por volta de 3200 a.C. de um ferimento de flecha que perfurou uma artéria. A ponta da flecha permaneceu cravada em seu ombro esquerdo. As condições glaciais preservaram grande parte de seus tecidos, ossos e órgãos.
A múmia de Ötzi tem 61 tatuagens espalhadas nas pernas, costas, peito e no pulso esquerdo. São traços, pontos e pequenas cruzes tatuados na parte inferior da coluna, nas articulações do joelho direito e tornozelo – áreas de maior degeneração provocada por esforço muscular. Isso sugere que as tatuagens podem ter sido feitas para aliviar a dor articular e, portanto, eram essencialmente terapêuticas e não simples decoração corporal.
Os 61 tatuados são comumente associados a pontos de acupuntura, levantando a hipótese de que o grupo de Ötzi soubesse da prática cerca de 2000 anos antes do que se acredita que ela surgiu na China.
Além disso, Ötzi tinha conhecimento de plantas medicinais. Entre seus pertences foram encontradas folhas de bétula, planta com poder antiinflamatório que pode agir como um antibiótico. A samambaia detectada em seu estômago poderia ter servido como tratamento de tênia.
As tatuagens da Dama do Gelo, de Altai
Os Pazyryk, antigo povo nômade que viveu nas Montanhas Altai, na Rússia siberiana também faziam tatuagens. Esses pastores e criadores de cavalos, floresceram entre os séculos VI e III a.C. Espalhados nas estepes entre a Rússia, Mongólia, China e Czaquistão, eles comercializavam com a Pérsia, Índia e China.
Em 1948, o corpo de um homem Pazyryk, de 2.400 anos de idade, descoberto no gelo da Sibéria, tinha membros e tronco cobertos por tatuagens de animais míticos.
Em 1993, foi descoberta, em um túmulo em Altai, o corpo mumificado de uma mulher com tatuagens em seus ombros, braços, pulsos e polegar. A chamada Dama ou Donzela do Gelo tinha cerca de 20 anos quando morreu de câncer, no século V a.C. Ao lado do corpo, havia um pote de maconha. Provavelmente, a droga era utilizada para cessar as dores provocadas pelo câncer.
Fonte
- LINEBERRY, Cate. Tattoos. The ancient and Mysterious history. Smithsonian Magazine, jan 2007.
- MARK, Joshua J. Tattos in Ancient Egypt. World History Encyclopedia, 9 jan 2017.
- SOLLY, Meilan. What Ötzi the Iceman’s tattoos reveal about Copper Age medical pratices. Smithsonian Magazine, 10 set 2018.
- DURÁN, Diego. La princesa tatuada que vino del hielo. 17 jul 2019. La Vanguardia. Historia Y Vida.
- KRUTAK, Lars. The Kayabi: tattooers of the Brazilian Amazon. 23 maio 2013.